domingo, 25 de março de 2012

CONTROVÉRSIA SOBRE A GRAÇA: PELÁGIO E AGOSTINHO

Pelágio e suas ideias
No ocidente as disputas teológicas concentram-se sobre as questões antropológicas e soteriológicas, ou seja, sobre o problema da salvação e seus fatores decisivos: a capacidade do homem, as consequências do pecado original, a relação entre a graça divina e a liberdade humana. Ao pelagianismo opô-se, no século V, Santo Agostinho.
No século V Pelágio havia debatido ferozmente com Agostinho sobre o pecado original e suas consequências. Agostinho mantinha a ideia que o pecado original de Adão foi herdado por toda a humanidade e que, mesmo que o homem caído retenha a habilidade para escolher, ele está escravizado ao pecado e não pode não pecar. Por outro lado, Pelágio insistia que a queda de Adão afetara apenas a Adão, e que se Deus exige das pessoas que vivam vidas perfeitas, Ele também dá a habilidade moral para que elas possam fazer assim. Ele reivindicou tempos adiante que a graça divina era desnecessária para salvação, embora, facilitasse a obediência.
Tudo isso se deu devido o caráter ocidental, romano e latino, da vida prática dos cristãos, sobretudo de Roma. Quando Pelágio chegou à cidade de Roma ficou profundamente impressionado com a imoralidade do ambiente, e decidiu começar uma reforma moralista nos sacerdotes romanos.
Com a multiplicação das conversões, a multidão que lotava igrejas era formada, em sua, maioria, por cristãos recém-convertidos, por catecúmenos insuficientemente instruídos que ainda viviam num ambiente amplamente impregnado de costumes pagãos; essa massa preocupava-se essencialmente em obter o perdão dos pecados e a garantia da felicidade no além (era rara a persuasão da necessidade de uma renovação interior que investisse o homem todo). Tais tendências eram reforçadas pelo ensino de Joviniano, em oposição à vida ascética - inadmissibilidade da graça do batismo, inutilidade das boas obras, não concessão de um valor especial à castidade - e, pelo fatalismo e dualismo dos maniqueus.



A pessoa de Pelágio:
Pelágio (350-425) era um monge nascido na Grã-bretanha, dotado de muita força de vontade e profundo senso do dever, eloquente e autodidata em teologia. Rigoroso com a moralidade do cristianismo, com um ideal de perfeccionismo, chegando a imputar no ser humano um certo grau de heroísmo, quase como uma auto-salvação. Chegado a Roma, começou a atacar a tepidez e hipocrisia de muitos cristãos, e logo um círculo de amigos se formou ao seu redor.
Insatisfeitos apenas com as exortações orais, os pelagianos tentaram também uma obra de renovação moral por meio de escritos: durante sua estada em Roma, Pelágio publicou um comentário às cartas de Paulo, e Celéstio, advogado e monge, um tratado sobre o pecado original (Contra traducem peccati).
O rigor moral não conseguiu evitar que o círculo pelagiano incidisse numa certa complacência para consigo mesmo, dado que transparece no comportamento de Pelágio.
A insistência sobre a coerência moral degradou-se na segurança de si e na confiança nas próprias forças; ademais pelágio estava persuadido de que a "Igreja somos nós", ele próprio contribuiu para a acentuação crescente desta atitude: embora pretendesse ser sobretudo um reformador social, teve de evocar princípios teóricos para justificar seu comportamento.

Princípios fundamentais do sistema de Pelágio:
- Absoluta liberdade e auto-suficiência do homem: a vontade humana é perfeitamente livre, dependente apenas de si para evitar o pecado;
- Justiça infinita de Deus: Deus é justo e não pode impor-nos algo que supere nossas forças, e não pode dar a alguém um auxílio maior que a outrem.

Destes dois princípios, Pelágio tirou várias consequências:
O homem não necessita da ajuda divina para observar os mandamentos: ele pode ser sem pecado e somente com o livre-arbítrio cumprir os mandamentos; a única graça admitida é a medicinal, para a remissão dos pecados pessoais e atuais; a criação, o livre arbítrio, a encarnação de Cristo, os exemplos de Cristo... São graças externas; negação da necessidade da graça interna sobrenatural que torna o homem capaz de compreender e de seguir aquilo que é incapaz, contando com seus próprios recursos.
Para Pelágio o cristão faz uso do poder que lhe foi dado uma vez para sempre na criação, isto é, a liberdade, único dom dado ao homem, que permanece, caso contrário, necessitaria de uma força estanha a sua vontade, isso poria fim a liberdade humano.
O pecado original não nos enfraqueceu e estamos nas mesmas condições em que Adão foi criado: Deus seria injusto imputando-nos uma culpa que nos é alheia; Adão foi criado mortal, com nossas mesmas concupiscências, que são fortes em nos devido aos efeitos dos maus hábitos e exemplos;
Sendo assim, a redenção consiste no bom exemplo que Cristo nos deu, vivendo entre nós; o batismo é necessário para os adultos, a fim de obter o perdão dos pecados pessoais, e não para as crianças antes do uso da razão (distinção entre Reino de Deus e vida eterna).
O cristianismo de Pelágio constituía uma reação à fé sem obras, próprio de joviniano, e ao pessimismo maniqueu, e reduzia-se a um complexo de preceitos morais. Negando a transmissão do pecado original e salientando as possibilidades inatas da natureza humana, reduzindo-se à simples iluminação do homem acerca do fim a ser perseguido, para, posteriormente coroar seus esforços para a consecução desse fim; Pelágio reduzia a graça ao perdão dos pecados atuais e a um conhecimento maior da lei divina, ou seja, a uma ajuda concedida à vontade humana, mas apenas para facilitar o que qualquer homem está em grau de cumprir com as próprias forças de sua natureza.


Bibliografia:

DANIÉLOU, J.& MARROU, H. Nova História da Igreja: dos primórdios a São Gregório
Magno, Vozes, Petrópolis, 1984.
FEINER, J. & LOEHRER, M. Misterium Salutis Vol. IV/7, Vozes, Petrópolis, 1978.
SESBOÜÉ, B. O Homem e Sua Salvação. Col. História dos Dogmas. vol.2, Loyola, SP,
2003.

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