sábado, 30 de dezembro de 2017

Homilia do Pe. Fantico Borges, CM – Missa da solenidade da Sagrada Família de Nazaré.

Homilia do Pe. Fantico Borges, CM – Solenidade da Sagrada Família de Nazaré.

“Sagrada Família de Nazaré minha casa vossa é!”

O Natal, sob muitos aspectos, é uma festa doméstica. Ela reúne a família, os irmãos distantes e, sobretudo, encanta as crianças com seus pais ao perceberem como estes valorizam, nesta ocasião, a variedade de símbolos. O clima de amor e confraternização perpassa a Solenidade do Nascimento do Senhor. Liturgicamente, a Igreja se detém no fato do Filho de Deus ter tido necessidade também de uma família que o acolhesse. Como homem, frágil e pequeno, precisou ser amado por um coração de mãe. Ele experimentou a dependência na submissão a seus pais. Ele vivenciou a contingência de crescer e aprender no interior de um lar e de uma cultura determinada. Eis o símbolo de Nazaré onde Jesus viveu e cresceu (Lc 2,39-40). O mistério inaudito da Encarnação se entrelaça, desta maneira, com a realidade da família, escola de amor e de fé, de inculturação e de sociabilidade.
Maria, a Virgem Mãe, acolhe na fé o mistério, fruto do seu ventre. São José também acolhe na Fé o mistério, adotando o Menino e recebendo a Mãe. Deste modo, assume a paternidade legal de Jesus, cumprindo com fidelidade sua altíssima e insubstituível missão: José, filho de Davi, não temas receber Maria, tua mulher, pois o que nela foi gerado vem do Espírito Santo. Ela dará à luz um filho e tu o chamarás com o nome de Jesus, pois ele salvará o seu povo dos seus pecados (Mt 1,20-21). A esta missão cumprirá José com todo amor e empenho. No seio de uma família Jesus encontra a segurança necessária para crescer e se desenvolver até atingir a consciência humana de sua missão divina.
A oportunidade da festa da Sagrada Família, como decorrência do mistério do Natal que celebramos, nos proporciona apresentá-la como protótipo, exemplo e modelo para todas as famílias cristãs (cf. Familiaris Consortio, Conclusão; Redemptoris Custos, III, 21). Embora se constitui também um mistério especial pela natureza do amor e do matrimônio que uniam José e Maria; a presença inestimável do Filho de Deus, e a natureza das relações materno-paternais de Maria e de José para com Ele, esta Família é modelo nas virtudes teologais, a serem cultivadas por todas as famílias cristãs. O sentido de Deus, do sagrado e do mistério, norteava e unia a Família de Nazaré. Por isso, mesmo tendo vivido uma situação especial e única de um lar construído na castidade perfeita, a serviço da Encarnação, ela é a expressão mais nítida da vivência das virtudes familiares e teologais. Serve, então, de estímulo e de intercessão para todas as famílias que queiram vivenciar os valores evangélicos. A propósito, nos lembrava o Papa São João Paulo II: “Por misterioso desígnio de Deus, nela viveu o Filho de Deus escondido por muitos anos: é, pois, protótipo e exemplo de todas as famílias cristãs. E aquela Família, única no mundo, que passou uma existência anónima e silenciosa numa pequena localidade da Palestina; que foi provada pela pobreza, pela perseguição, pelo exílio; que glorificou a Deus de modo incomparavelmente alto e puro, não deixará de ajudar as famílias cristãs, ou melhor, todas as famílias do mundo, na fidelidade aos deveres quotidianos, no suportar as ânsias e as tribulações da vida, na generosa abertura às necessidades dos outros, no feliz cumprimento do plano de Deus a seu respeito” ( Conclusão da Familiaris Consortio).
Hoje, na medida em que avança a secularização do pensamento e do comportamento, mesmo a família cristã se priva, muitas vezes, da sua dimensão sagrada. Mal se dá conta que o amor de Deus em Cristo a uniu, mediante o Sacramento do Matrimônio, para ser sinal visível e terno de sua presença em todas as expressões da vida conjugal e familiar. Quanto mais difícil se torna a proposta cristã para família contemporânea, mais imperioso se faz anunciá-la como boa e alegre  notícia de salvação.
Há um evangelho para a família, aquele que supõe uma espiritualidade conjugal e familiar e uma ética própria, baseada na abertura da família aos apelos de Deus, do meio social e cultural e das necessidades de seus membros. O critério supremo da vida conjugal e familiar é o amor ou a caridade como veículo da perfeição (Cl 3,16). Neste sentido, a família cristã se instaura no mundo e na Igreja como escola de amor a Deus e ao próximo, casa das primeiras experiências de fé, lugar do acolhimento dos valores ético-cristãos, mediante o respeito aos mandamentos do Senhor, a oração e o diálogo entre as diferenças.
No livro do Eclesiástico apresentam-se os valores de uma família judaica, do cuidado com os pais e do respeito dos filhos. A família em Israel era tida como celular mantenedora dos valores tradicionais da sabedoria popular do Povo de Deus. Preservar a família era o mesmo que conservar e perpetuar a cultura do povo judeu. Por isso, para um judeu o valor da família é um bem inalienável. Honrar pai e mãe era encarado como preceitos de tradição divina. A lei mosaica era muito rígida neste aspecto. Daí as leituras de hoje fazerem tantas referências aos costumes familiares comuns a todo Israel. Infringir essas normas familiares era o mesmo que desobedecer ao ordenamento divino das relações humanas. 
Nestas mesmas linhas expostas acima são lidos também alguns preceitos gerais da vida cristã e alguns preceitos particulares da vida familiar cristã (Cl 3,12-21). Paulo propõe um itinerário de santidade para os eleitos de Deus, expresso pelas virtudes humanas no relacionamento mútuo: sentimentos de compaixão, bondade, humildade, mansidão, longanimidade (v.12); suportação e perdão recíproco, à semelhança do Senhor que perdoa (v.13); a caridade, como vínculo da perfeição (v.14); o cultivo interior da paz de Cristo para formar um só corpo e o agradecimento (v.15). Acrescenta elementos práticos, típicos das reuniões litúrgicas, que podem ser adaptados à família reunida em oração: a presença habitual da Palavra de Cristo, a motivar o ensinamento e a admoestação mútuo, com toda a sabedoria, e a ação de graça a Deus, através de salmos, hinos e cânticos espirituais (v.16). Além disto, apresenta uma norma para qualquer palavra ou ação: tudo fazer em nome do Senhor Jesus, dando por Ele graças a Deus, o Pai (v.17).
Em tudo que envolve essa festa da Sagrada Família, especialmente hoje, última celebração de 2017, é a possibilidade de sonhar com sociedade melhor que se constrói a partir do respeito pelas pessoas, da gratidão para com aqueles que nos ajudaram a viver e a crescer como pessoas, como cidadãos, por fim, da descobrir do amor de Deus que se esconde em coisas simples do dia a dia.
Quero concluir minha meditação com essas palavras de São João Paulo II: “Que São José, ‘homem justo’, trabalhador incansável, guarda integérrimo dos penhores que lhe foram confiados, as guarde, proteja e ilumine. Que a Virgem Maria, Mãe da Igreja, seja também a Mãe da ‘Igreja doméstica’ e, graças ao seu auxílio materno, cada família cristã possa tornar-se verdadeiramente uma ‘pequena Igreja’, na qual se manifeste e reviva o mistério da Igreja de Cristo. Seja Ela, a Escrava do Senhor, o exemplo de acolhimento humilde e generoso da vontade de Deus; seja Ela, Mãe das Dores aos pés da Cruz, a confortar e a enxugar as lágrimas dos que sofrem pelas dificuldades das suas famílias. E Cristo Senhor, Rei do Universo, Rei das famílias, como em Caná, esteja presente em cada lar cristão a conceder-lhe luz, felicidade, serenidade, fortaleza”.
Nas mãos de Jesus, Maria e José confio cada família deste imenso Brasil. Que sejam Eles a enriquecer cada lar com sua graça.  A todos e a cada um, assegurando a minha constante prece, concedo de coração uma bênção sacerdotal para um ano novo cheio de amor e fidelidade em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo.


Pe. Fantico Borges, CM


segunda-feira, 25 de dezembro de 2017

Homilia Pe. Fantico Borges, CM – Missa de Natal

Homilia Pe. Fantico Borges, CM – Missa de Natal

Natal de Nosso Senhor Jesus Cristo, segundo a carne!

Nasceu Jesus, é natal de Nosso Senhor Jesus Cristo, segundo a carne! Vida nova que brota do amor misericordioso de Deus. Aos homens que viviam nas sombras do pecado, marcados pelas trevas dos erros, nasceu uma nova luz, uma luz resplandeceu para todos! Essa mensagem fez crescer a alegria e aumentou a certeza da nossa felicidade.
Todos são chamados a regozijar-se Deus, contemplando a sua presença no presépio. Como alegres pessoas que descobriram um tesouro ou ganhadores de uma loteria, a satisfação invade os corações de quem descobriu o verdadeiro sentido do natal.
Nasceu hoje para vós o Salvador! Por isso, nesta noite não cabe tristeza, não cabe amargura ou rancor. Deus veio visitar-nos e perdoar nossa divida. Alegria e exultação, festa e jubilo felicidade e amor são esses nossos sentimentos hoje! Abramos nosso coração, abramos nossa vida, nossos afetos, nossos sentimentos, nossos projetos para o mistério deste dia de natal.
Belém se faz aqui, hoje, é dia da gente se encontrar, é dia de renascer, o senhor conosco quer morar! Por Ele os anjos cantam jubilosos, os coros dos santos exultam de alegria! O anjo de Deus vem dizer-nos novamente: não tenhais medo! Hoje na cidade de Davi, nasceu para vós o salvador, que é Cristo Senhor.
Juntemos nossa voz a voz dos anjos no céu a cantar: glória a Deus nas alturas, e paz na terra aos homens por ele amados! Essa mensagem de paz é o símbolo mais concreto do natal. Num mundo que patrocina a guerra, numa cultura de bombas atômicas, verbalizando um contexto de neo-guerra-fria, onde falta caridade e sobra arrogância, a passagem do natal quer ser uma palavra de protesto. Como cristãos não podemos nos calar diante da violência que mata tantas pessoas, que aborta tantas vidas inocentes. Os cristãos não podem mais calar em meio aos escândalos de corrupção de ceifam sonhos e massacram os pobres. Enquanto hoje muitos vão para casa comer e celebrar o natal pense nos milhares de irmãos refugiados que não têm um teto para descansar, uma escola para estudar, um local para trabalhar. Como será para eles o natal? Que tempo da graça eles podem vislumbrar?
   Despojemo-nos, portanto, do velho homem com atos perversos e renunciemos as discórdias. Partilhemos o amor e um pouco dos nossos bens com os que nada têm e façamos do natal a festa da solidariedade. Desde encarnação do Filho de Deus já participamos da natureza divina, não voltemos à escuridão por comportamentos indignos de Cristo. Lembremos de que cabeça e de qual corpo fazemos parte!  
Neste momento em que o criador se faz criatura é mister as palavras de Santo Agostinho: “Expergiscere, homo: quia pro te Deus factus est homo - Desperta, ó homem, porque por ti Deus se fez homem!  Por tua causa Deus se fez homem. Estarias morto para sempre, se ele não tivesse nascido no tempo. Jamais te livrarias da carne do pecado, se ele não tivesse assumido uma  carne semelhante à do pecado. Estarias condenado a uma eterna miséria, se não fosse a sua misericórdia. Não voltarias à vida, se ele não tivesse vindo ao encontro da tua morte. Terias perecido, se ele não te socorresse. Estarias perdido, se ele não viesse salvar-te". Agradeça a Deus sua infinita misericórdia por ti construindo, já aqui e agora, na cidades dos homens, a cidade de Deus!


Pe. Fantico Borges, CM 

sábado, 23 de dezembro de 2017

Homilia do Pe. Fantico Borges, CM – IV Domingo do Advento (Ano B)

Homilia do Pe. Fantico Borges, CM – IV Domingo do Advento (Ano B)

E Verbo carne se fez!

Com esta liturgia do IV domingo do advento entramos no final desde curto tempo litúrgico. No centro desta liturgia está a figura de Maria. O menino que vai nascer é Filho de Deus, o Emanuel Deus conosco. Neste domingo ele já se faz presente, ainda de modo velado, mas real, no seio da Virgem, que concebeu por obra do Espírito Santo (cf. Lc.1,26-38)
A leitura do Evangelho de Lucas que escutamos neste domingo nos recorda o prelúdio de nossa redenção, quando Deus enviou o Arcanjo Gabriel à Virgem Maria para comunicar-lhe o novo nascimento, na carne, do Filho de Deus, e por quem, deposta a antiga culpa, possamos ser renovados e contados entre os filhos do altíssimo.
Ao descrever a encarnação do Verbo de Deus, o evangelista Lucas demonstra que este menino é verdadeiro homem, filho de Davi, filho de Abraão, ou seja, é totalmente homem. Ao narrar a concepção de Maria Virgem, que foi mãe por virtude do Espírito Santo, afirma que é verdadeiro Deus; e, finalmente, ao citar a gravidez inesperada de Isabel declara o poder daquele que há vir, o Salvador prometido pelos profetas, o Emanuel, o Deus conosco.
O Anjo Gabriel foi enviado por Deus a uma cidade da Galileia chamada Nazaré, a uma virgem desposada com um homem chamado José, e a virgem se chamava Maria. Virgem desposada, ou seja, ainda não casada. Isso prova que Maria era virgem e que não havia vivido com José. Mas, ao mesmo tempo, o evangelista também quer dizer que Jesus tem uma estirpe, isto é, uma tribo, uma origem e uma família, a de Davi. Ele não cai de paraquedas na história humana, mas entrelaçado na linhagem desde Adão até José e Maria.
O anjo, estando na presença de Maria dirá: Conceberás em teu ventre e darás à luz um filho e lhe porás o nome de Jesus. Ele será grande, se chamará Filho do Altíssimo, e o Senhor Deus lhe dará o trono de seu pai Davi (Cf: Lc, 1, 31-32).  Chama de pai a Davi e o reino o Israel, nisto consiste que ele reinará sobre seu povo, isto é, o povo de Deus, os cristãos que em seu nome colocam as suas esperanças e sonhos.
Daqui a pouco veremos Jesus reclinado numa manjedoura, o que é uma prova da misericórdia e do amor de Deus. Neste tempo venturoso de Natal, tudo rende graças a Deus! Estar diante dEle; contemplá-lo na manjedoura, dobrar o joelho em agradecimento por tudo que vivemos este ano, que estar terminando, não há nada mais importante a ser feito. Quanto mais contemplamos e subindo ao cimo do seu amor mais emudecemos e silenciamos no seu mistério. Não se precisará de palavras. Não se dirá mais nada, mas só o estar aí diante dEle. Ele é o Deus amando-me. E se Deus se faz homem e me ama como não procurá-Lo? Como perder a esperança de encontrá-Lo, se é Ele que me procura? Afastemos de nosso coração todo possível desalento, toda tristeza. Que as dificuldades exteriores e a nossa miséria pessoal não tirem a alegria  diante do Natal que se aproxima.
Levanta tu que dormes; esperta do sono do pecado, e, tua alma vem contemplar no presépio Aquele que os profetas predisseram; que a Virgem esperou com amor de mãe; que João anunciou estar próximo e depois mostrou presente entre os homens.
Deste presépio em Belém Deus quer nascer em tua casa. Que tua casa sejas Belém e teu coração a manjedoura, onde o menino nascerá. Olhas para a gruta de Belém, em vigilante espera, e compreendes que somente com Ele poderás aproximar-te confiadamente de Deus Pai.
Por ocasião do Natal, onde preparamos a casa para receber os amigos e familiares, decoramos a arvore de natal e enchemo-la de presentes, não falte no centro de tudo isso uma imagem de Jesus menino, nem uma oração profunda de gratidão a Deus. Lutemos com todas as nossas forças, agora e sempre, contra o desânimo na vida espiritual, o consumismo exagerado, e a preocupação quase exclusiva pelos bens materiais. Na medida em que o mundo se cansar da sua esperança cristã, a alternativa que lhe há de restar será o materialismo, do tipo que já conhecemos; isso e nada mais. Por isso, nenhuma nova palavra terá atrativo para nós se não nos devolver à gruta de Belém, para que ali possamos humilhar o nosso orgulho, aumentar a nossa caridade e dilatar o nosso sentimento de reverência ao nosso Criador e Salvador.

Que Deus nasça em cada coração e que com Virgem Maria sejamos benditos e benditas de Deus. Feliz natal 

sexta-feira, 22 de dezembro de 2017

MENSAGEM DE NATAL



MENSAGEM DO PE. FANTICO BORGES, CM

FELIZ NATAL AOS AMIGOS E FIÉIS CATÓLICOS!

Em fim é natal! Tempo de alegria e festa, de encontrar amigos e sorrir, pois nasceu para nós o Salvador, que é Cristo-Senhor. Mas o natal é tempo de recordar que Deus se compadeceu do ser humano e veio salvá-lo de seus pecados, veio libertar quem estava preso, curar quem estava doente, sarar as feridas da alma e anunciar o tempo da graça do Senhor! Será que todos vivem esse tempo? Ou muitos ainda esperam o Natalício desta aurora?
Para muitos pobres essa natal será de dificuldade, pobreza, fome, dor, lamento. Muitos estão presos, doentes, privados de liberdade. Num país cheio de desigualdades, onde poucos têm muito e muitos nada possuem não é fácil afirmar que o tempo da graça já chegou para todos! Eis aí um grande desafio para todos os cristãos de hoje.
Todavia, contradizendo a lógica da desigualdade nasceu para nós o Salvador, que é o Cristo Senhor! Por isso a alegria da Igreja em exultar com todos os homens e mulheres de boa vontade! Abramos o nosso coração, abramos a nossa vida, os nossos afetos, os nossos sentimentos, os nossos projetos ao mistério da Noite grandiosa do natal. Pelo Menino-Deus os anjos cantam jubilosos, os coros dos santos exultam de alegria! Alegremo-nos também nós, pois nasceu o Deus Salvador! Esta noite é de imensa alegria. Hoje, amados filhos, nasceu o nosso Salvador. Alegremo-nos! Não pode haver tristeza no dia em que nasce a vida; uma vida que, dissipando o temor da morte, enche-nos de alegria com a promessa da eternidade. Ninguém está excluído da participação nesta felicidade. Exulte o justo, porque se aproxima à vitória; rejubile o pecador, porque lhe é oferecido o perdão; reanime-se o pagão, porque é chamado à vida! Nesta noite venturosa Deus se fez pequeno, visível aos nossos olhos. Ele quis nos mostrar a sua face e levar-nos ao seu amor.
Tomemos consciência da nossa dignidade, não deixemos que os erros e defeitos da humana história, deforme o que Deus salvou! Lembremos que aquele que era rico se fez pobre para enriquecer a todos! Não voltemos aos erros de antes por comportamento indigno da nossa condição de cristãos. Despojemo-nos do velho homem com seus pecados e vícios e revistamo-nos do novo homem marcado por Cristo Jesus.
Desperta, ó filho meu, porque hoje brilhou para você a luz! Por você, o Filho eterno fez-se homem! Eis a maior prova de amor de Deus. Como cantam as antigas liturgias da noite de natal: “Aquele que deu forma a todas as coisas recebe a forma de escravo; Aquele que era Deus é gerado na carne; eis que ele é envolvido em panos, Aquele que era adorado no firmamento; e eis que repousa numa manjedoura Aquele que reinava no céu” (Missal Gótico, Missa do Natal).
Como vimos o natal não festa, troca de presentes, comilança e bebedeira. Natal é a renovação de todos as formas de amor. Tempo de solidariedade e partilha. Faça tudo para ser feliz neste natal se reconciliando consigo, com os outros. Faça o bem e imite os gestos de Jesus.
Desejo que você tenha no olhar o encantamento da vida! Que você tenha no coração a plenitude do amor! E que você acredite na grandeza de  Deus, no destino do mundo, na beleza da vida, nos sonhos e na esperança de mundo melhor, mais humano e solidário!

Desejo a você um Feliz Natal!

PE. FANTICO BORGES, CM 

sábado, 16 de dezembro de 2017

Homilia do Pe. Fantico Borges, CM – III domingo do Advento ano b 2017

Homilia do Pe. Fantico Borges, CM –  III domingo do Advento ano b 2017

A Alegria do Senhor é a nossa Força, por isso, alegrai-vos nEle!

A litúrgica da Igreja chama este Terceiro Domingo do Advento de Gaudete, isto é “Alegria!” “Alegrai-vos sempre no Senhor. De novo eu vos digo: alegrai-vos! O Senhor está perto!” (Fl 4,4.5).
No domingo anterior vimos a figura de João Batista, como o Evangelho de Marcos nos apresentou: o profeta do reino, que pregou um batismo de conversão. Neste domingo, no Evangelho, podemos ver como o evangelista João identifica o Batista: como a voz que clama no deserto, ou seja, a testemunha da glória de Deus no Filho. Em São Marcos, centrado na figura de Jesus que proclama a chegada do Reino de Deus, o Batista é o profeta escatológico, o novo Elias, que deve preparar aos corações para que, mediante a conversão, participem do Reino. Já no evangelista São João, que evita a historização do Reino, como também o tradicionalismo das conceituações apocalípticas sobre o profeta do fim; a figura do Batista é tomada como um sinal que aponta o envio de Deus, o qual estar desconhecido no meio do mundo. Por isso, João Batista é chamado de voz que clama no deserto! Se, portanto, o Batista aponta essa Luz como estando presente, desconhecida, no meio de nós, ela não apenas quer dizer que (ainda) não tivemos a chance de descobri-la, mas sugere que é preciso querer descobri-la. Para poder ver é preciso querer ver. Assim, o Evangelho de hoje desperta em nós a necessidade de uma decisão pelas palavras do Batista “No meio de vós está quem vós não conheceis”, somos convidados a querer descobri-lo, dilatando nosso coração em Alegria.    
A alegria do Senhor é ver-nos felizes! Assim a liturgia de hoje revela a proximidade do Natal! Diz São Paulo aos tessalonicenses: Alegrai-vos no Senhor e rezai sem cessar... Afastai-vos de toda espécie de maldade, não apagueis o Espírito, isto é, guardai vivo o fogo interior e incentivai com ações visíveis diante dos irmãos, para que o Deus da paz vos santifique totalmente e tudo aquilo que sois: alma, corpo e espírito sejam guardados sem mancha alguma para vinda de nosso Senhor Jesus Cristo. Deus através do Apóstolo admoesta para, ponderando tudo, avaliar segundo a vontade de Deus e ficar com aquilo que serve para nossa salvação.
Paulo nos aponta onde nasce a verdadeira alegria: ela nasce da oração: rezai sem cessar; daí graças em todas as circunstâncias; aqueles que rezam alcançam a graça de Deus e a felicidade duradoura. Mas o que significa essa alegria no mundo hoje? Para muito é o banquete da ceia natalina, um restaurante cinco estrelas, um hotel de luxo, etc. Mas a alegria verdadeira é outra! São Paulo dizia “por tudo dai graças a Deus”. A alegria nasce da abertura do coração aos apelos do Espírito que convida à conversão, a mudança de vida; nasce de uma vida moral irrepreensível (afastai-vos de toda espécie de maldade!), ou seja, dos pecados, dos vícios, das injustiças, do adultério, da mentira, da calunia e por fim a alegria nasce de uma vida santa: tudo que sois, seja preservado de toda mancha do pecado, isto é, que os poderes infernais não dominem sobre os filhos da luz. Para tudo isso é necessário acreditar que “Aquele que vos chamou é fiel.” Com essa certeza corramos ao encontro do Cristo que vem, tendo nossas lâmpadas acessas pela consciência da nossa condição de criaturas diante do Criador.
A vinda de Jesus, feito homem, abriu o caminho que nossos pecados fecharam. A trilha tortuosa em que o homem vivia por sua culpa foi endireitada pelo percussor para que o homem encontrasse novamente a luz que é Jesus. Segundo São Cirilo de Alexandria “existem acessos públicos e trilhas quase impraticáveis, íngremes e intransitáveis, que algumas vezes obrigam a subir os montes e as colinas, e outras a descê-las; ora te colocam à beira de precipícios, ora te fazem escalar altíssimas montanhas. Porém, se estes lugares isolados e abruptos descerem, e se preencherem as cavidades profundas, aí sim, o torcido se endireita totalmente, os campos se aplainam e os caminhos, antes íngremes e tortuosos, tornam-se transitáveis. É isso, só que em nível espiritual, o que faz acontecer o poder do salvador” (São Cirilo de Alexandria, Comentários sobre o livro do profeta Isaias, 3,4). Podemos dizer que aos homens estava vedado o acesso a uma vida exemplar, pois a alma aprisionada pelo pecado, mergulhada nos apetites mundanos, entorpecida aos impulsos abomináveis da carne, não enxergava a luz de Deus. Uma vez que Cristo se fez carne e destruiu o pecado, abatendo o soberano mal dominador deste mundo, Ele nivelou o caminho para nós, um caminho muito apto para correr nas sendas da piedade; um caminho sem encostas acima, nem declives ladeirentos, realmente liso e plano. Só Cristo é a luz que não tem ocaso, a salvação eterna. Ele é o caminho da glória do Senhor, e todos, contemplamos sua glória, glórias que antes não conhecíamos, e, só depois da encarnação passamos conhecê-la e ama-la como única salvação.  
No sentido acima exposto a alegria é uma busca por colocar-se no seguimento de Jesus. João Batista, aquele que testemunha a chegada de Deus nos oferece uma exemplo claro de como devemos comporta-nos diante de Deus. Ele não é arrogante nem tenta enganar os outros querendo ser o que não é. Dirá com isso Santo Agostinho: “João era a voz, mas o Senhor, no princípio, era a Palavra. João era a voz passageira, Cristo a Palavra eterna desde o princípio”. João sabia que não era a palavra e que sem ela ressoava ao ouvida, mas não alimentava o coração. João é voz que clama no deserto: aplainai os caminhos do Senhor. E porque é difícil não confundir a voz com a palavra, julgaram que João era Cristo. Confundiram a voz com a palavra. Mas a voz reconheceu o que era para não prejudicar a palavra. Eu não sou o Cristo (Jo 1,20), disse João nem Elias, nem profeta. Sou apenas a voz que clama no deserto. E novamente dirá Agostinho: “O que significa: Aplainai o caminho do Senhor, senão: Orai como se deve ser? O que significa ainda: Aplainai o caminho senão: tende pensamentos humildes? Imitai o exemplo de João. Julgam que é o Cristo e ele diz não ser aquele que julgam; não se aproveita do erro alheio para uma afirmação pessoal. Se tivesse dito: ‘eu sou o Cristo’, facilmente teriam acreditado nele, pois já era considerado como tal antes que o dissesse. Mas não disse; pelo contrario, reconheceu o que era, disse o que não era, foi humilde. Viu de onde lhe vinha a salvação; compreendeu que era uma lâmpada e temeu que  o vento do orgulho pudesse apaga-la” (Santo Agostinho, dos Sermões 293, 3).  
João reconhece aquele que nos traz a alegria verdadeira. Nossa alegria está no Senhor e não em outro. Alegrai-vos! Há quem se alegre no pecado, há quem se alegre em futilidades, há quem, mesmo alegrando-se com coisas que valem a pena, esquece que toda alegria é passageira. Quanto a vós, caríssimos, alegrai-vos com tudo quanto é bom e louvável, mas colocai vossa maior e definitiva alegria no Senhor! Somente nele o coração repousa plenamente, somente nele encontramos a paz que dura mesmo em meio à tribulação mais feroz, somente nele o anseio mais profundo de nossa alma encontra satisfação. Como lembrava-nos Agostinho nas Confissões: “Nosso coração estará inquieto enquanto não repousar no Senhor”. Alegrai-vos! Mas seja o Senhor o fundamento da vossa alegria, a causa última da vossa exultação!
Resta-nos, então, escutar com atenção este ultimo conselho de São João Crisótomo: “Que pode perturbar o santo? A morte? Não, porque a deseja como prêmio. As injúrias? Não, porque Cristo ensinou a sofrê-las. A doença? Também não, porque a Escritura aconselha: Aceita tudo o que Deus te mandar, e permanece em paz na tua dor, e no tempo da humilhação tem paciência; porque o ouro e a prata se provam no fogo, e os homens amados de Deus, no cadinho da tribulação (Ecl 2, 5). Que resta então, que seja capaz de perturbar o santo? Nada. Na terra, até a alegria costuma acabar em tristeza; mas, para quem vive de acordo com Cristo, as próprias penas se transformam em alegrias” (Homilias sobre as estátuas, 18).
Num mundo que despreza ou ao menos é indiferente a Deus e seus mandamentos, numa sociedade pagã, senão secularizada que ridiculariza a fé e olha com indiferença os que amam a Deus, tenhamos esta certeza: “Quem vos chamou é fiel; ele mesmo realizará isso!” Ele nunca nos deixará! Ele é a nossa alegria, esta alegria é a nossa força!


Pe. Fantico Borges, CM 

domingo, 10 de dezembro de 2017

Homilia do Pe. Fantico Borges, CM – II domingo do Advento ano B 2017

Homilia do Pe. Fantico Borges, CM – II domingo do Advento ano B 2017

Preparai o coração para acolher o Senhor!

Neste segundo domingo do Advento os textos litúrgicos chamam atenção para conversão, para vinda do Senhor no natal. O mundo, porém, parece continuar mudo e insensível a esse acontecimento. O apelo é para todos! “Consolai o meu povo, falai ao coração de Jerusalém e dizei em alta voz que sua escravidão acabou.” Com estas palavras Isaias nos diz que Deus quer salvar todos àqueles que nele esperam. Preparai no deserto o caminho do Senhor, aplainai, na solidão, a estrada de nosso Deus. O deserto é o lugar do encontro do penitente com sua consciência. Diante de Deus estamos a sós com Ele. São João da Cruz fala da solidão como separação afetiva e efetiva de pessoas e coisas para melhor se relacionar com Deus, necessária para uma proveitosa concentração que leva à descoberta de Deus e sua experiência. Neste sentido, o silêncio da oração é ir ao deserto do nosso interior para construirmos um diálogo proveitoso com Deus. Assim o silêncio é uma atitude interior de amor e de escuta de Deus que modera todas as nossas atividades: gostos, paixões, desejos, palavras e atos. O silêncio é terapêutico-espiritual que fortalece a caminhada no combate diária pela santidade.
No caminho da santidade, então, se encontram gestos de conversão: preparem os caminhos do Senhor, nivelem-se os vales, rebaixem-se todos os montes e colinas; endireitem-se o que é torto e alisem-se as asperezas. Levantem a voz e proclamem o poder do Senhor Jesus Cristo. Para tanto, tudo começa com a humildade. João Batista é esta figura que com total humildade preparou os caminhos do coração para receber o Filho de Deus. Diz João Batista: “depois de mim virá alguém mais forte do que eu. Eu nem sou digno de me abaixar para desamarrar suas sandálias” (Mc 1,7). Falando sobre a humildade nos Escritos Espirituais, São João da Cruz diz que “a humildade precede a glória”. Tem mais proveito para salvação o ser humilhado do que o reconhecimento e aplausos dos outros. Pois o homem sozinho não faz nada de bom. Ensina Santo Afonso Maria de Ligório que a oração é o substrato da vitória e que somente com humildade se alcança o cume. Devemos todos imaginar que estamos sobre as alturas de um monte, suspensos sobre o abismo de todos os pecados e sustentados apenas pelo fio da oração; se este fio se arrebentar, cairemos certamente neste abismo e cometeremos os crismes mais horrorosos. Se Deus não me tivesse ajudado, já teria caído no inferno (sl 93,17). Assim falava o salmista e assim deve dizer cada um de nós. Se Deus não estiver ao nosso lado quando chegassem as tentações, com certeza cairíamos nos mesmos pecados que condenamos nos outros.  
João Batista veio preparar os caminhos de Jesus. Pregou um batismo de conversão para o perdão dos pecados. Em João o penitente primeiro se arrependia de seus pecados, maldades, maquinações e depois recebia o batismo nas águas do Jordão. Em Jesus o batismo é um ato livre de Deus, pois nos é dada a graça mesma como pecadores. Daí uma diferença ontológica no ato de batizar, João batiza com água para conversão em Jesus é oferecido o amor de Deus gratuitamente.  
Neste tempo litúrgico a meditação sobre a figura de João, o Batista faz pensar na nossa caminhada. Este é aquele de quem falou o profeta Isaías dizendo: “Voz do que clama no deserto; preparai os caminhos do Senhor, endireitai suas veredas”. A missão de João Batista foi a de ir à frente do Senhor para preparar os seus caminhos, ou seja, dispor um povo que receba o Reino de Deus com consciência reta. João foi o primeiro a seguir esse itinerário, buscando uma vida simples e humilde, vivendo no deserto a fim de encontrar Deus pela oração e chamar pelo testemunho de fé muitas almas para o Senhor.
Os primeiros discípulos seguiram Jesus por indicação expressa dele e muitos outros se prepararam interiormente para segui-Lo graças à sua pregação. Mas é importante notar em João que sua vocação abarca sua vida inteira e leva a fazer girar tudo em torno da missão divina. Cada homem, no seu lugar e dentro das suas próprias circunstâncias, tem uma vocação dada por Deus. Quando um marido santifica seu lar com atos justos, verdadeiros à luz do evangelho, estar sendo um Batista; quando uma mulher busca edificar sua vida por meio da obediência a Palavra de Deus exerce a missão de João Batista; quando um sacerdote vive em obediência ao seu ministério, numa vida de castidade, pobreza e abandono a Deus torna-se um Batista. Neste sentido nossa vida deve ser uma carta convite a Jesus como também um ato de contradição para este mundo.
Preparai os caminhos do Senhor, endireitai as suas veredas… O Batista é a voz que anuncia Jesus. “Entretanto, hoje João Grita e diz: preparai o caminho do Senhor, aplainai os caminhos de nosso Deus. Se ele nos manda preparar o caminho do Senhor, a saber: não se refere às desigualdades do caminho, mas à pureza da fé. Porque o Senhor não deseja abrir um caminho nas veredas da terra, mas no segredo do coração” (São Máximo de Turim sermões, 88,2).  Por isso mesma toda sua vida estar definida em função de Jesus, como teria que acontecer na nossa vida, na vida de qualquer Cristão. O importante de nossa vida é Jesus!
O Precursor indica-nos o caminho que devemos seguir: o importante é que Jesus Cristo seja anunciado, conhecido e amado. Só Ele tem palavras de vida eterna, só nEle se encontra a salvação. A atitude de João é uma clara e enérgica advertência contra o desordenado amor próprio que sempre nos incita a colocar-nos indevidamente em primeiro plano. Uma preocupação de singularidade, a ânsia de sermos protagonistas, não deixaria lugar para Jesus. Sem humildade, não poderíamos aproximar os nossos amigos de Deus. E então a nossa vida ficaria vazia.
Que tipo de testemunhas nós somos? Como é nosso testemunho Cristão entre os nossos colegas, na família? Nossos atos cotidianos dão sinais de sermos discípulos de Jesus? Tem eficácia suficiente para persuadir os que ainda não creem em Jesus, os que ainda não o amam, os que têm uma ideia falsa a seu respeito? O nossa vida é coerente com o Evangelho?
Aproveite o tempo do Advento para preparar seu coração para Deus, nivele seus pensamentos ao Evangelho, aplaine seus desejos aos projetos do Reino, alise as asperezas de seu coração com gesto de solidariedade, fraternidade e amor.  Ganhemos para Deus o maior número possível de almas. Ensinava Sto. Agostinho: “ Não queirais viver tranquilos até conquistá-los para Cristo, porque vós fostes conquistados por Cristo”.


Pe. Fantico Borges, CM 

sábado, 2 de dezembro de 2017

Homilia do Pe. Fantico Borges, CM – I domingo do Advento ano B

Homilia do Pe. Fantico Borges, CM – I domingo do Advento ano B

Vigiai até que Ele venha!

Na liturgia deste primeiro domingo do Advento, começamos o ano litúrgico de 2018. Um tempo novo brota para todos nós como expectativa da aurora resplandecente. Com advento Deus nos afirma que há uma esperança para nosso futuro. Eis chegado o tempo tão importante e solene que conforme diz o Espírito Santo, é momento favorável, o dia da salvação (cf. 2cor 6,2), da paz e da reconciliação. É o tempo que outrora os patriarcas e profetas tão ardentemente desejaram com seus anseios e suspiros; o tempo que o justo Simeão finalmente pôde ver cheio de alegria, tempo celebrado sempre solenemente pela Igreja, e que também deve ser constantemente vivido com fervor, louvando e agradecendo ao Pai eterno pela misericórdia que nos revelou neste mistério. Em seu imenso amor por nós, pecadores, o Pai enviou sem Filho único a fim de libertar-nos da tirania e do poder do demônio, convidar-nos para o céu, revelar-nos os mistérios de seu reino celeste, mostrar-nos a luz da verdade, ensinar-nos a honestidade dos costumes, comunicar-nos os germes das virtudes, enriquecer-nos com os tesouros da sua graça e, enfim, adotar-nos como seus filhos e herdeiros da vida eterna. 
Celebrando a cada ano este mistério, a Igreja nos exorta a renovar continuamente a lembrança de tão grande amor de Deus para conosco. Ensina-nos que a vinda de Jesus Cristo não foi proveitosa apenas para seus contemporâneos, mas que sua eficácia é comunicada a todos que mediante a fé e os sacramentos levam uma vida digna de filhos de Deus. Assim, a manifestação escatológica, prometida por Deus, se cumpre em Jesus Cristo, o qual é a epifania plena das promessas divina. Segundo São Carlos Borromeu, “a Igreja deseja ainda ardentemente fazer-nos compreender que Cristo, assim como veio uma só vez a este mundo, revestido de nossa carne, também está disposto a vir de novo, a qualquer momento, para habitar espiritualmente em nossos corações com a profusão de suas graças, se não opusermos resistência” (São Carlos Borromeu, Cartas Pastorais sobre o advento, In Ofício das leituras 1ª semana Advento)
O profeta Isaías fala com ênfase da era messiânica, quando todos os povos se hão de reunir em Jerusalém para adorarem o único Deus. Essa imagem corresponde com as expectativas do senhorio de Deus como rei, juiz e Senhor. Belém é a imagem da promessa que se cumprirá com a casa de Israel. Jerusalém é figura da Igreja, constituída por Deus “sacramento universal de salvação” ( LG 48), que abre os seus braços a todos os homens para os conduzir a Cristo e para que, seguindo os seus ensinamentos, vivam como irmãos na concórdia e na paz.
A vinda do Senhor será o juízo de Deus para todos, ninguém ficará sem julgamento. Diz São Cirilo de Jerusalém que “virá o Salvador, não para ser novamente julgado, mas para chamar a juízo aqueles que se constituíram seus juízes. Ele que ao ser julgado, guardara silencio, lembrará as atrocidades dos manifestadores que o levaram ao suplício da cruz, e lhes dirá: eis o que fizestes e calei-me (Sl 49,21)” (São Cirilo de Jerusalém, as duas fases da vinda de Cristo, In liturgia das horas, oficio do 1º domingo Advento). Naquele tempo Jesus veio para realizar um desígnio de amor, na segunda vinda ele virá para submeter ao seu juízo todas as coisas. 
Em Paulo encontramos a ideia que com Jesus chegou o tempo da graça, nEle fostes enriquecidos em tudo para dar bom testemunho da nova vida em Cristo. Todos os dons foram dados pelo Espírito Santo, a fim de que em tudo guardeis a revelação do Senhor Jesus. E diz Paulo que é Jesus quem nos dará perseverança em nosso procedimento irrepreensível até o fim.  
O Evangelho (Mc 13,33-37) é uma exortação à vigilância constante para preparar a vinda do Senhor. Preparemos o caminho para o Senhor que chegará em breve; e se notarmos que a nossa visão está embaçada e não distinguimos com clareza a luz que procede de Belém, é o momento de afastar os obstáculos. É tempo de fazer com especial delicadeza o exame de consciência e de melhorar a nossa pureza interior para receber a Deus. É o momento de discernir as coisas que nos separam do Senhor e de lançá-las para longe de nós. Pensarmos com sinceridade em nossos atos e corrigir os desvios, endireitar as veredas, aplainar os caminhos tortuosos e endireitar a estrada que leva à vida eterna, mudando nosso modo de ser e ver as pessoas e as relações. O advento, neste sentido exige coragem para limpar a casa espiritual, queimar a eira e as palhas de nossos pecados. Um bom exame de consciência deve ir até as raízes de nossos atos, a fim de superar as paixões, desejos e vontades que não levam a Deus. E logo o remédio podemos encontrar no Sacramento da Penitência! Procure o confessor, não tenho medo de falar de seus erros a quem deseja seu perdão. A igreja não quer condenar, o padre não pode julgar. O confessionário não é um tribunal inquisitório, mas sim um lugar de reconciliação e misericórdia.   
É mister que tenhamos um cuidado redobrado com nossa vida espiritual! “Ficai atentos, porque não sabeis quando chegará o momento” (Mc 13, 35). Não sabemos o quando se dará a “parusia”, mas isso não é uma falha casual de Jesus. Deus no seu infinito amor quis que estivéssemos sempre prontos para encontrarmos com ele. Se soubéssemos o dia e a hora talvez relaxaríamos pensando dará tempo é só daqui a tempo... Somos craques em retardar as coisas pesando que dará tempo! Se agirmos assim com Deus perderíamos tempo em coisas fúteis e não desfrutaríamos da salutar companhia de Deus. Por isso mesmo não foi dada ao homem saber a hora, nem o lugar. Assim todo dia é momento de preparar-se e todo lugar é local da epifania do Senhor.
Desta forma, o símbolo da fé que professamos na liturgia convida-nos a crer naquele que subiu aos céus, onde está sentado a direita do Pai. E de novo há de vir, em sua glória, para julgar os vivos e os mortos; e o seu reino não terá fim. Nosso Senhor Jesus Cristo virá portanto dos céus, virá glorioso no fim do mundo, no último dia. Dar-se-á a consumação do mundo, e este mundo que foi criado será inteiramente renovado.
Para manter este estado de vigília, é necessário lutar, porque a tendência de todo homem é viver de olhos cravados nas coisas da terra. Fiquemos alertas! Assim será se cuidarmos com atenção da oração pessoal, que evita a tibieza e, com ela, a morte dos desejos de santidade; estaremos vigilantes se não abandonarmos os pequenos sacrifícios, que nos mantêm despertos para as coisas de Deus. Diz-nos São Bernardo: “Irmãos, a vós, como às crianças, Deus revela o que ocultou aos sábios e entendidos: os autênticos caminhos da salvação. Aprofundai no sentido deste Advento. E, sobretudo, observai quem é aquele que vem, de onde vem e para onde vem; para quê, quando e por onde vem. É uma curiosidade boa. A Igreja não celebraria com tanta devoção este Advento  se não contivesse algum grande mistério”.
Procuremos afastar os motivos que impedem a acolhida do Senhor:
- os prazeres da vida: a pessoa mergulhada nos prazeres fica alienada… No domingo, dorme… passeia … pratica esportes … mas não sobra tempo para Missa.
- trabalho excessivo: a pessoa obcecada pelo trabalho esquece o resto: Deus, a família, os amigos, a própria saúde…
Criemos atos que sejam de proveito para nosso encontro com Deus. O pedido que fazemos neste início de preparação do natal é que pelos menos deem a Deus a mesma atenção que depositam nos preparativos das coisas profanas neste período! Que Deus abençoe a cada um e a Virgem derrame seu manto em nossa caminhada neste advento! 


Pe. Fantico Borges, CM 

domingo, 26 de novembro de 2017

Homilia do Pe. Fantico Borges, CM – Solenidade de Cristo Rei.

Homilia do Pe. Fantico Borges, CM – Solenidade de Cristo Rei.

Viva o Rei Jesus!
Com esta solenidade de Cristo, Rei do Universo, encerramos o Ano Litúrgico de 2017. No próximo domingo, dia 03 de dezembro, será o primeiro domingo do Advento, um novo Ano Litúrgico, início da preparação para o Natal. Ainda que as festas da Epifania, Páscoa e Ascensão sejam também festas de Cristo Rei e Senhor de todas as coisas criadas, a festa de hoje foi especialmente instituída para nos mostrar Jesus como único soberano de uma sociedade que parece querer viver de costas para Deus. Nosso Rei não estar montado num trono de ouro, nem ornamentado com joias de prata ou pérolas preciosas. Nosso Rei estar erguido num madeiro, laudado por dois ladrões. Mas é nessa imagem kenótica que está o esplendor da glória de Deus. “Adoramos, Senhor, tua cruz, na qual está depositada toda a nossa esperança de salvar-nos, porque será ela que dá aos nossos corpos a imortalidade e a claridade.” (Santo Efrém, canto fúnebre, 42)    
Jesus veio ao mundo para buscar e salvar o que estava perdido; veio em busca dos homens dispersos e afastados de Deus pelo pecado. E como estavam feridos e doentes, curou-os e vedou-lhes as feridas. Tanto os amou que deu a vida por eles. Como Rei, vem para revelar o amor de Deus, para ser o Mediador da Nova Aliança, o Redentor do homem. No Prefácio da Missa fala-se de Jesus que ofereceu ao Pai “um reino de verdade e de vida, de santidade e de graça, de justiça, de amor e de paz”. Se tomarmos a liturgia da leitura de Ezequiel Deus é o bom pastor que cuida e protege seu rebanho. Vem para tomar conta da ovelha desgarrada, procurar aquela que se perdeu, enfaixar a perna quebrada, fortalecer a doente, resgatar de todo mal caminho a ovelha perdida, fazer repousar aquela que se fadigou e vigiar a ovelha gorda. Ao contrario do velho Adão, que trouxe a morte, Cristo novo Adão trouxe vida e esperança.
Assim é o Reino de Cristo, do qual somos chamados a participar e que somos convidados a dilatar mediante um apostolado fecundo que subsiste no senhorio de Cristo no coração dos fiéis. O fim será o triunfo de jesus que tudo entregará ao Pai no Espírito Santo.
O Senhor deve estar presente nos nossos familiares, amigos, vizinhos companheiros de trabalho… Perante os que reduzem a religião a um cúmulo de negações, ou se conformam com um catolicismo de meias-tintas; perante os que querem por o Senhor de cara contra a parede, ou colocá-Lo num canto da alma…, temos de afirmar, com as nossas palavras e com as nossas obras, que aspiramos a fazer de Cristo um autêntico Rei de todos os corações…, também dos deles. O Deus cujo evangelho anuncia não é passivo, mas toma a peito a paixão pelo ser humano a ponto de afirmar que tudo feito aos pequeninos deste mundo é a Ele que o fazemos. Deus se coloca no lugar da criatura de tal forma que o bem feito a Deus é atribuídos como aqueles dispensados aos pobres e necessitado. Deus está presente naqueles que sofrem e se identifica com eles. Todo isso, me faz crer “que esta descrição tão detalhada daquele juízo, que parece um quadro vivo, não tem outra finalidade que inculcar-nos a beneficência e induzir-nos a praticar a benevolência. Nela vai registrada a vida. Ela é a mãe dos pobres, a mestra dos ricos, a bondosa nutriz de seus pupilos, a protetora dos anciãos, a despensa dos necessitados, o porto comum dos miseráveis, a que assiste a todas as idades, a que atende em todas as aflições e calamidades” São (Gregório de Nissa Sermão sobre o amor aos pobres).  
Disse o Papa São João Paulo II: “A Igreja tem necessidade sobretudo de grandes correntes, movimentos e testemunhos de santidade entre os fiéis, porque é da santidade que nasce toda a autêntica renovação da Igreja, todo o enriquecimento da fé e do seguimento cristão, uma re-atualização vital e fecunda do cristianismo com as necessidades dos homens, uma renovada forma de presença no coração da existência humana e da cultura das nações”.
A atitude do cristão não pode ser de mera passividade em relação ao reinado de Cristo no mundo. Nós desejamos ardentemente esse reinado. É necessário que Cristo reine em primeiro lugar na nossa inteligência, mediante o conhecimento da sua doutrina e o acatamento amoroso dessas verdades reveladas. É necessário que reine na nossa vontade, para que se identifique cada vez mais plenamente com a vontade divina. É necessário que reine no nosso coração, para que nenhum amor se anteponha ao amor de Deus. É necessário que reine no nosso corpo, templo do Espírito Santo; no nosso trabalho profissional, caminho de santidade… Convém que Ele reine!”(Papa Pio XI).
Cristo é um Rei que recebeu todo o poder no Céu e na terra, e governa sendo manso e humilde de coração, servindo a todos, porque não veio para ser servido, mas para servir e dar a sua vida para a redenção de muitos.
O Evangelho (Lc 23, 35-43) apresenta o Rei no trono da Cruz; Cristo não aparece sentado num trono de ouro, mas pregado numa cruz, com uma coroa de espinhos na cabeça, com uma irônica inscrição pregada na cruz: “Jesus Nazareno Rei dos Judeus”.
A cruz é o trono, em que se manifesta plenamente a realeza de Jesus, que é perdão e vida plena para todos. A cruz é a expressão máxima de uma vida feita Amor e Entrega. Na oração do Pai Nosso Jesus no ensina a pedir: “Venha a nós o vosso Reino”. Jesus nos convida a fazer parte desse Reino e a trabalhar para que esse Reino chegue ao coração de todos. Por isso celebramos hoje o DIA DO LEIGO cuja missão é a de ser “protagonista da Evangelização” (Conferencia de Santo Domingo). O leigo, ou seja, todo aquele que tendo sido regenerado na água batismal como fermento no mundo, através de suas ações dá sabor divino às realidades terrenas. São “homens e mulheres no coração do mundo, e mulheres e homens do mundo no coração da Igreja” (Aparecida, 209). Por isto, se queremos transformar o mundo com a presença santificadora do Evangelho de Jesus Cristo, precisamos trabalhar, cada vez mais, em nossas comunidades para viver a doutrina cristã e os valores evangélicos, para que assim, como discípulos missionários, unido a Cristo Rei do Universo se coloque à serviço da comunidade, partilhando seus dons, tornando-se uma oferenda agradável a Deus Pai.
Que Maria, a Mãe santa do nosso Rei, Rainha do nosso coração, cuide de nós como só Ela o sabe fazer.


Pe. Fantico Borges, CM 

domingo, 19 de novembro de 2017

Homilia do Pe. Fantico Borges – XXXIII Domingo do Tempo Comum – Ano A

Homilia do Pe. Fantico Borges – XXXIII Domingo do Tempo Comum – Ano A
Trabalhai para sua santificação!
Caríssimos irmãos e irmãs se aproxima o domingo de Cristo Rei. A liturgia vai tomando como pano de fundo o juízo do justo rei-juiz de todos. Como doador dos dons Deus chamará todos para prestar contras dos talentos entregues a cada um, segundo sua capacidade. Aquele que recebeu cinco talentos e o que recebeu somente dois foram bons trabalhadores. Cada um deles, recebidos os talentos, “negociou com eles; fê-los produzir, e ganhou outros” (Mt 25,16). É preciso trabalhar! Mais ainda, é preciso trabalhar bem! São João Paulo II, na sua Carta Encíclica sobre o trabalho humano Laborem exercens, falava de “elementos para uma espiritualidade do trabalho”. O trabalho é dom de Deus em nossas vidas. 
Também é verdade que muitas pessoas não querem trabalhar. São preguiçosas e escondem os talentos para não se fadigarem. Quem não trabalho, diz o Apóstolo Paulo, não deve comer! Com o nome de talento se deve entender aquilo que qualquer pessoa recebeu. São Gregório Magno diz que devemos saber que não existe ninguém ocioso que esteja seguro de não ter recebido algum talento, porque não existe ninguém que diga: “eu não recebi nenhum talento, portanto não estou obrigado a prestar contas” (São Gregório Magno: sermões sobre os Evangelhos, 9). Todos, cristãos ou ateus, pobres ou ricos, negros ou brancos receberam bens para seu crescimento pessoal e para colaboração no crescimento dos outros.  Esses talentos são oportunidades da mente humana crescer e produzir frutos para si e para o mundo. Quem se abstém desta tarefa desvincula-se de sua missão existencial.
Podemos ter a certeza que o Senhor nos deu uma vida, “a cada um de acordo com a sua capacidade”. Ora, é esta vida, dom de Deus, fruto de um desígnio de amor sem fim, que cada um de nós deve responsavelmente cultivar e fazer frutificar em benefício para nosso irmãos e irmãs. Na leitura de provérbios a figura da mulher forte aparece como um exemplo de alguém que não se contenta em passar pela vida, mas vai tecendo o fio da existência com as pequenas fidelidades de cada dia. O importante da vida é observar o essencial, a beleza que escode-se por detrás das coisas que fazemos. A aparente estética das coisas passará, a verdadeira vida encontra-se no temor do Senhor.  Do mesmo modo, a segunda leitura chama-nos atenção para o fato que nos serão pedidas contas da vida, dom recebido de Deus. Daí, o conselho: “Não durmamos, como os outros, mas sejamos vigilantes e sóbrios”. São Gregório diz que devemos considerar o que temos recebido para empregá-lo bem. Que não exista nenhum cuidado terreno que nos impeça a vida espiritual, para que não venha a acontecer que, escondendo o talento na terra, provoque-se a ira do Senhor dos talentos.  
O mundo moderno, com todo sua técnica, pensa que a existência material é seu modo absoluto de ser. Fechados em si mesmos, os homens pensam que podem ser felizes construindo a vida de seu próprio modo, dando os parâmetros do seu agir. Esta é a grande tentação pós-moderna! Que grande Ilusão! A vida é dom de Deus e somente nos faz felizes se dela fizermos um diálogo amoroso com o Senhor, autor e doador de nosso ser. Mais que talentos na vida, o Senhor nos concedeu a própria vida como um precioso talento. Desenvolvê-lo, ser feliz e buscar não a nossa própria satisfação, não nossa própria medida, não nosso próprio caminho, mas fazer da existência uma busca amorosa e cheia de generosidade da vontade de Deus, isso sim realiza o ser humano porque mais que tenha coisas e poder a vida somente é bela se é cheia de sentidos que transcendem os bens materiais. O mundo dos ricos já demostra que ter nunca é sinal de felicidade. Muitas pessoas que possuem bens, títulos, aplausos, também comentem suicídio. Ser feliz é encontrar sentidos transcendentais, divinos para viver. Eis! Somente seremos felizes e maduros quando tivermos a capacidade de arriscar verdadeiramente nos perder, nos deixar para nos encontrar no Senhor, alicerce e fonte de nossa vida. Eis o verdadeiro investimento!
Infelizmente, a dinâmica do mundo hodierno, pagão e ateu, não nos ajuda nessa direção. Há distração demais, novidade demais, produto demais a ser consumido; há preocupação demais com uma felicidade compreendida como satisfação de nossos desejos, carências e vontades. Há consciência de menos de que a vida é dom e serviço, doação e abertura para o infinito; há percepção de menos de que aqui estamos de passagem e de que lá, junto ao Senhor, é que permaneceremos para sempre. Atolamo-nos de tal modo nos afazeres da vida, no corre-corre de nossas atividades, no esforço por satisfazer nossas vontades, na busca de nossa auto-afirmação, que perdemos a capacidade de compreender realmente que somos passageiros e viajantes numa existência breve e fugaz que somente valerá a pena se vivida na verdade, se for compreendida como abertura para o Senhor e se por amor a ele, for abertura generosa e servidora para os outros.
A advertência do Apóstolo Paulo deve nos conduzir nesta meditação: “Vós, meus irmãos, não estais nas trevas, de modo que esse dia vos surpreenda como um ladrão. Todos vós sois filhos da luz e filhos do dia”. Vivamos da Luz. O vaticano II dizia Lumen gentium Christis - Cristo, Luz dos povos. Viver na luz, viver no dia é viver na perspectiva de Cristo Jesus, é valorizar o que ele valoriza e desprezar o que ele despreza. Filhos da luz, filhos do dia – eis o que deveríamos ser! Mas, com tanta frequência nossa mente e nosso coração, nossos pensamentos e nossos afetos encontram-se entenebrecidos como o dos pagãos… Quão grave para nós, porque conhecemos a Luz, cremos no Dia que é o Cristo-Deus!  Será que ignoramos quem é o dono dos talentos? Será que desprezamos seus bens a ponto de tornamo-lo infrutíferos? Por acaso fazemos pouco caso do juízo divino? Consideremos, pois, o que é que temos recebido, e estejamos atentos para empregá-lo bem. O servo preguiçoso, quando o juiz pede contas das culpas, desenterra o talento. Existe, portanto, muitos que se afastam dos desejos e obras terrenas, por aviso do juiz, quando já entregues ao suplicio eterno. Vigiemos, portanto, antes que nos seja solicitada a conta do talento, para que, quando o juiz estiver ameaçando com castigo, sejamos libertos dele pelo lucro que tivermos alcançado.  
Peçamos ao bondoso Deus que não sejamos tragados pelo desanimo da tardança dos frutos, nem pelas tarefas puramente mudando sem dar a devida atenção às coisas do alto. Que Maria santíssima passe à frente de nossos empreendimentos para pensarmos e agirmos em vista do Reino de seu Filho Jesus Cristo. 

Pe. Fantico Borges, CM   

sábado, 11 de novembro de 2017

Homilia do Pe. Fantico Borges – XXXII domingo do tempo comum ano A

Homilia do Pe. Fantico Borges – XXXII domingo do tempo comum ano A

Uma Igreja previdente sempre está vigilante no amor!

Na Liturgia deste Domingo, XXXII do Tempo Comum, Deus nos fala através do autor bíblico que sábio é quem teme a Deus e se afasta do mal. Sabedoria é, ao mesmo tempo, dom de Deus, mas, também, resultado de uma busca humana. Sabedoria não é só sistematizar algum conteúdo científico ou tirar nota dez em determinadas áreas do conhecimento e, às vezes, tirar zero na convivência com as pessoas, na solidariedade, no amor a Deus e ao próximo, etc. Sabedoria é sobressair-se bem diante das questões fundamentais de nossa vida. Por isso, sabedoria e prudência caminham juntas sempre. São Gregório de Nazianzeno ensinando em sua catequese dizia que “as lâmpadas acesas são figuras daquela procissão de tochas com que, quais radiantes almas virgens, não adormecidas pela preguiça ou indolência, sairemos ao encontro de Cristo, o esposo, com as radiantes lâmpadas da fé, a fim de que não se apresente de improviso, sem que saibamos, aquele cuja vinda esperamos, e nós, desprovidos de combustível e de azeite, carecendo de boas obras, sejamos excluídos do tálamo nupcial” (Gregório Nazianzeno, Sermão da festividade do Batismo, 40,46).
A prudência, a vigilância, o estar de prontidão são figuras de como devemos esperar o esposo. Como não sabemos a hora, nem o dia, alerta-nos São Pedro a sermos sóbrios e vigilantes porque o adversário está rodeando-nos para devorar aos que tiverem descuidados.
Na segunda leitura o Apóstolo Paulo esclarece aos tessalonicenses que, diante da morte de alguns membros da comunidade, ficavam em dúvida sobre a salvação em Cristo, pois viviam na expectativa de estarem todos vivos para o dia da vinda do Senhor. Paulo os anima, explicando-lhes que o cristão não pode ser, diante da morte, como os pagãos que não têm esperança, pois se cremos que Jesus ressuscitou, devemos, também, crer que os mortos ressuscitarão e estarão com o Senhor. A certeza que Paulo deseja incutir no coração da comunidade é que há uma unidade entre a Igreja peregrina, aquela que esperava a vinda eminente do Senhor, e os que já na glória participavam na morte da esperança escatológica de Cristo. Na segunda vinda do Senhor, nos encontraremos todos juntos: os vivos e os que já morreram.
No Evangelho Mateus trata do discurso escatológico de Jesus que descreve a conclusão do Reino na terra. Tudo é claramente orientado e exprime o insistente convite à perseverança e à vigilância: “Vigiai, portanto, porque não sabeis nem o dia nem a hora”. A parábola das dez virgens é uma alegoria das núpcias de Cristo com sua Igreja. Na Igreja, as virgens, isto é, os cristãos, caminham juntos ao encontro do senhor, recebem a mesma missão de Jesus: fazer o bem, amar, produzir frutos, boas obras. Mas, infelizmente, uns são bons, vigilantes, fiéis, sensatos; outros são maus, infiéis, insensatos, autossuficientes, centrados em si mesmos, se julgam sábios e esquecem o principal: as boas obras. Para estes, fecham-se as portas. No caminho da vida, achavam que os outros poderiam substituí-los, responder por eles, querem aproveitar o azeite (santidade) dos outros e, por isso, improvisam o encontro. Iniciaram a caminhada de fé, mas não se mantiveram alertas.
Aquela triste e miserável cena será dramática: “estará presente aquele que, ao se ouvir a sinal, exigirá que saiam ao seu encontro. Então todas as almas prudentes lhe sairão ao encontro com uma luz radiante e com superabundante provisão de azeite; as almas restantes, muito conturbadas, pedirão inoportunamente azeite àquelas que estão bem abastecidas. Porém, o esposo entrará apressadamente e as prudentes entrarão juntamente com ele; porém às imprudentes que empregaram o tempo em que deveriam entrar no preparo de suas lâmpadas, lhes será  proibido o ingresso e se lamentarão aos gritos, compreendendo, demasiado tarde, o prejuízo que acarretaram com sua negligência e sua indolência” (Gregório Nazianzeno, Sermão da festividade do Batismo, 40,46). A porta lhes será fechada e por mais que supliquem não se abrirá.
O momento da vinda de Jesus, o noivo, no fim dos tempos, é desconhecido (morte, juízo final). É preciso que as virgens, isto é, as comunidades cristãs, estejam abastecidas do combustível das boas obras, preparadas, para o encontro com o Senhor, mediante a prática da justiça (o azeite) e dos valores do Reino. Quem negligenciar esta vigilância, achando ter todo tempo para encontrar o azeite da lamparina, pode-se dar conta de ser tarde demais. Não imiteis tampouco aqueles que recusaram participar das bodas que o bom pai preparou para magnífico esposo, apresentando como desculpa, embora acabe de casar-se, seja o campo recentemente comprado, seja a junta de bois mal-adquirida: privando-se deste modo de bens maiores pelo solicitude de coisas insignificantes e fúteis. Diz São Cirilo de Alexandria que “como as insensatas não trouxeram nada, suas almas começam a esvaecer-se e como apagar-se e a serem levadas até um delírio, pensando que terão compaixão delas graças à virtude dos outros” (São Cirilo de Alexandria, Fragmentos sobre o Evangelho de São Mateus, 280). A virtude de cada um, a muito custo, basta para salvação da sua alma, porque até aqueles que são sábios cometem transgressões de muitas maneiras.    
A comunidade sem óleo vive no vazio, no escuro, é uma comunidade estéril. Mas, qual é a raiz da esterilidade? A ausência de relação intensa e contínua com Deus. É o desconhecimento do Espírito Santo, cujo primeiro fruto é a caridade. A oração, a intimidade com Deus mantém aceso o amor. Quem ama não esquece da pessoa amada. Há esquecimentos que não são falta de memória, mas de amor: “Quem não ama carrega dentro de si um germe homicida” (1Jo 3, 15).
O convite final desta liturgia consiste em estarmos de prontidão, pois o augustíssimo noivo, excelso Senhor e Salvador vem ao nosso encontro, e quem estiver com a lâmpada acesa ingressará no seu reinado. Oxalá que também nós nos façamos partícipes de tais mistérios de amor e nupcialidade de Jesus Cristo.

Pe. Fantico Borges, CM

quinta-feira, 9 de novembro de 2017

Espiritualidade para casais


Espiritualidade para casais 


E a família, como vai? FAMÍLIA, COMUNHÃO DE PESSOAS.
Muito se fala da crise da família. Nos últimos tempos, no entanto, pudemos ver sinais na linha de  sua revalorização. Ela  continua sendo, apesar de todas as  transformações, o espaço primeiro e privilegiado de personalização e socialização, espaço de auto-realização, comunicação, lazer e afeto. Quando alguém não vive em família, essa lacuna se fará sentir para sempre, impedindo o amadurecimento  pessoal de  que se viu privado de casa, pai, mãe, tendo também sérias influências no ambiente externo. Disto estão convencidos psicólogos, assistentes sociais, sociólogos e educadores.  Na família acontecem as  primeiras experiências da vida, que tanta importância têm na configuração da maneira pessoal de se situar no mundo. Tudo o que acontece depois, na idade adulta servirá para modificar ou enriquecer essas experiências fundamentais. Quando elas forem dolorosas e negativas ocasionam danos que dificilmente podem ser superados (cf.  Pedro José Gómez Serrano,  La família, escuela de liberación, justicia ey solidariedad, in Sal Terrae 91 (2003), p 373ss)
A família não pode ser uma camisa-de-força. Em certas configurações de família do passado, marcadas pela supremacia masculina, em tempos em que  unidade familiar era mais do que tudo uma unidade de trabalho, nem sempre as pessoas eram respeitadas, de modo especial as mulheres e as crianças.  Filmes e livros não se cansam de mostrar os malefícios de uma certa família do passado.  Certamente, ela não pode se transformar, hoje, numa espécie de ninho quente  onde seus membros vivem uma espécie de célula “gostosa”, distante dos desafios do mundo. Uma tal concepção seria completamente danosa para os seus membros e para a sociedade.  Por vezes, tem-se a impressão de que cristãos das classes remediadas  vivem um familismo sem sentido e sem amanhã. A família é responsável pela transformação do mundo.
Na esteira do personalismo de  Emanuel Mounier, João Paulo II, ao descrever a família,  fala de uma comunhão de pessoas. “A família, fundada e vivificada pelo amor, é uma comunidade de pessoas, do homem e da mulher, dos pais e dos filhos, e dos parentes. A sua primeira tarefa é a de viver fielmente a  realidade da comunhão num constante empenho por fazer crescer uma autêntica comunidade de pessoas. O princípio interior, a força permanente e a meta última de tal dever é o amor: como, sem o amor a família não é uma comunidade de pessoas, assim, sem o amor, a família não pode viver, crescer e aperfeiçoar-se como comunidade de pessoas”  ( Familiares consortio, n. 18).
A família satisfaz  a necessidade básica de conhecimento, intimidade e de colaboração do ser humano e de sua libertação da solidão e do medo diante do futuro. Em seu seio há a oportunidade de ser desenvolvido o melhor que alguém carrega em si, de fazer uma integração de sua complexa personalidade e de sempre melhorar sua condição espiritual.
A dupla orientação na direção da liberdade e solidariedade, da unidade e da distinção exigem relacionamentos novos.  É indispensável relacionar-se, reconhecendo o valor pessoal, pois do contrário somos ilhas isoladas. No seio da família, âmbito de relacionamentos, experimenta-se a alegria de uns pertencerem aos outros. Assim, se deixa a rede de individualismo e se vive a comunhão solidária.  Benito Goya  afirma:  “O lar se converte em espaço de comunhão de pessoas adultas e estabelece entre os cônjuges um estilo existencial atraente e construtivo, que favorece o espírito de doação, de apoio mútuo e de compromisso em projetos comuns. Esta harmonia entre os esposos constitui uma base sólida para que também as relações filiais sejam gratificantes”  (La nueva família. Una espiritualidad de comunión, in  Revista de Espíritualidad (59) (2000) p. 48).
A família cristã  é aquela em que pais e filhos procuram configurar os relacionamentos interpessoais no lar a partir de atitudes e valores propostos pelo Evangelho, aquela que é construída e constituída sobre a fé em Cristo Jesus. No seu fundamento está o amor do casal que supõe as condições normais e as exigências para inauguração de qualquer vida conjugal: amor, responsabilidade, comunidade de vida. Ela reveste-se, no entanto, de diferente iluminação. Seus membros são de Cristo e querem ser mais dele. Morreram a si mesmos pelo Batismo e vivem numa célula de Igreja na Igreja. É por tudo isso, que o matrimônio é sinal do mistério nupcial de Cristo com a Igreja que se entrega ao amor do Pai na unidade do Espírito Santo. 
O Papa Paulo VI chamava a família cristã de Igreja doméstica, lugar onde se aprende o amor a Deus, a conviver e os valores cristãs.  O texto-base da Campanha da Fraternidade de 1994, rezava:  “A expressão Igreja doméstica designa a realidade mais profunda do casal e da família e se tornou expressão muito frequente em documentos recentes do Magistério para caracterizar a identidade mais profunda da família cristã. A exemplo da Igreja, ela é chamada a ser santuário da vida, que acolhe, vive, celebra e anuncia a Palavra de Deus. É ainda santuário onde se edifica a santidade e a partir de onde a Igreja e o mundo podem ser santificados. Lá se celebra e se anuncia a Palavra, se vive a vivência da reconciliação pelo perdão mútuo. Destarte, a família, através das quatro facetas do amor humano reproduz as quatro experiências de vida da própria Igreja: experiência de Deus como Pai, experiência de  Cristo como irmão, experiência de filhos em, com e pelo Filho, experiência de Cristo como esposo da Igreja” ( Campanha da Fraternidade/ 1994, n. 176).
Ninguém é coisa no seio das famílias, todos possuem sua identidade. Pessoas se encontram com pessoas. Pais, filhos, avós, esposos, todos procuram viver relacionamentos fraternos no reconhecimento do diferente sem indiferença. Ali vidas se interpenetram, ou seja, cultivam a inteligência, fortalecem a vontade e nutrem afetos. E essa célula se irradia para fora como matriz da sociedade. Nada de familismo, nada de famílias guetos, mas comunidades vigorosas que não se deixam enredar pelo consumismo, pelo hedonismo e pelo relativismo. Essas famílias assim solidificadas poderão fazer de sorte que as novas gerações não sejam joguetes do acaso e de uma sociedade sem sentido.
Mais do que nunca está em jogo a identidade de comunidade cristã. A mídia bombardeia com informações incompletas as consciências ainda em formação dos nossos jovens. Priva-lhes o acesso a verdade por meio de ilusões novelescas, manobrada diabolicamente para vender uma cultura relativista e pouco humanizada, onde a família não garante segurança, mas apenas consiste num espaço de possessivos domínio do mais forte.     

Construamos nossas famílias e pastorais moldados na sociedade do amor e da paz, conscientes que, a grande contribuição do cristianismo para pós-modernidade é exatamente a fidelidade ao mistério de Cristo, sempre atual nas pessoas, que tomando sua cruz sinceramente não se cansam de afirmar: Ele é o Caminho, a Verdade e a Vida!
Perguntas:
1.      Na família acontecem as  primeiras experiências da vida, que tanta importância tem na configuração da maneira pessoal de se situar no mundo. Como você ver essa desvalorização da experiência familiar no desenvolvimento humano-cristão?
2.      Nada de familismo, nada de famílias guetos, mas comunidades vigorosas que não se deixam enredar pelo consumismo, comunidade familiar onde reine comunhão. Como contribuir para isso acontecer em sua casa? 

Pe. Fantico Borges, CM

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